O país perdeu no sábado aquela que é sempre lembrada como sua primeira Miss Brasil oficial. A baiana Martha Rocha ficou conhecida por vencer o concurso em junho de 1954, quando ele começou a ser realizado oficialmente no Hotel Quitandinha, em Petrópolis, Região Serrana do Estado do Rio. E também por ter perdido depois o concurso nos EUA para ser Miss Universo.
Naquele ano, segundo o Dicionário Cravo Albin, Martha teria sido convencida por Guilherme Simões, sobrinho do fundador do jornal “A Tarde”, a participar do concurso de Miss Bahia. Coroada Miss do estado, viajou ao Rio de Janeiro e concorreu ao título de Miss Brasil, sendo eleita por grande maioria.
Meses depois, a Miss Brasil concorreu ao posto de Miss Universo nos Estados Unidos e ficou em segundo lugar, atrás da americana Miriam Stevenson. O suposto motivo da derrota foram “duas polegadas” a mais em seu quadril, o que a própria Martha Rocha desmentiu depois.
As “duas polegadas” teriam sido uma invenção do jornalista João Martins, da revista “O Cruzeiro”, segundo o livro “O império do papel: os bastidores de O Cruzeiro”, de Accioly Netto. Martha afirmou em sua autobiografia que nos Estados Unidos ninguém lhe tirara as medidas.
A história virou marchinha de carnaval em 1955, com o refrão “Por duas polegadas a mais, passaram a baiana pra trás/Por duas polegadas, e logo nos quadris/Tem dó, tem dó, seu juiz”.
Mesmo com o segundo lugar, Martha foi recebida com grande festa em sua volta ao Brasil.
Segundo o jornalista Artur Xexéo, colunista do GLOBO, explicou à Globonews, na verdade houve uma miss Brasil antes de Martha (Yolanda Pereira), mas ela foi muito mais emblemática, até pelo momento por que o Brasil passava em meados da década de 50:
— O Brasil estava um pouco deprimido, teve toda uma questão política daquele ano, a morte do Getúlio Vargas. E, de repente, a gente quase ganha um concurso internacional, e tinha uma mulher linda representando o Brasil para o mundo inteiro. Então, foi um acontecimento mesmo — disse Xexéo, lembrando que Martha virou notícia a partir daí: — Quando ela casou, quando separou, quando ia a uma festa, todas as atenções se voltavam para ela, e isso era notícia no dia seguinte.
A artista Jane Di Castro escreveu em seu Facebook estar arrasada com a notícia: “Amava a Martha, querida amiga, musa e eterna Miss Brasil”.
A atriz Vera Fischer, Miss Brasil 1969, também lamentou ao G1 a morte da colega:
— Ela é a grande miss, icônica, do Brasil. Também era uma mulher intelectualmente muito rica, muito criativa, pintava quadros, era uma mulher muito interessante, com uma grande personalidade. Acho que todos nós vamos lamentar a perda dessa mulher incrível, lindíssima e que vai permanecer para sempre.
Em vídeo no Instagram, o cantor e compositor Caetano Veloso lembrou a beleza de Martha (“ela era lindíssima”) e recordou que, quando era estudante, chegou a ir até a porta da casa dela em Salvador para vê-la, depois que ela voltou do concurso nos EUA.
Nascida em Salvador em 19 de setembro de 1936, Martha era a sétima filha do casal Álvaro e Hansa Rocha e casou-se cedo com o banqueiro português Álvaro Piano. Com ele teve dois filhos: Álvaro Luis e Carlos Alberto. Pouco depois, Piano morreu num acidente de avião. Martha retornou ao Brasil e em 1961 casou-se com Ronaldo Xavier de Lima, com quem teve a artista plástica Claudia Xavier de Lima.
Em 2019, ela relatou em seu Facebook que tinha perdido nos anos 90 todo o seu dinheiro para o ex-cunhado Jorge Piano, com a quebra da Casa Piano: “Em 1995, com a fuga de Jorge Piano com todo o meu dinheiro, superei meus problemas com suporte de meus dois filhos, duas amigas e o meu trabalho honrado, vendendo os quadros pintados por mim, e ganhando cachê para divulgar o concurso Miss Brasil”, escreveu.
Também no ano passado, Martha divulgou que, por questões financeiras, estava vivendo num lar de idosos em Volta Redonda, no Sul Fluminense. Ela morreu no sábado em Niterói, na Região Metropolitana do Rio, aos 83 anos, vítima de insuficiência respiratória seguida de infarto. O enterro ocorreu neste domingo, no Cemitério no Santíssimo Sacramento.